IX
Há sítios onde o sol é mais escuro. E onde a sombra é ainda vida. Ditosa. Aí, nos restaurantezitos onde as toalhas são de papel aos buraquinhos
Do outro flanco do cosmos, com as luzes ao máximo, onde máxima felicidade por viver na sombra não desagua. Há sombras de todas as idades, todas as identidades. Cinzentas ou mais descobertas. Olhos mais nivelados ou mais esquivos. Muitos dos vultos ainda com trapos por decima, roupa de trazer por casa. Pijama húmido, pantanoso de dia-a-dia. Odor de monotonia amorfa. Apesar de insípida, acinzentada. Olhos de amplitude meia, por economia de zelo. Coragem. Na barragem onde a coragem escassa por enxugo assaz. Tudo tapado por urbanas praxes como biombos em pátria de fracos. Fracos onde o h existe mas não gravado com o abecedário da bondade mas da inveja intacta. Lembro o dia em que fui ao restaurante distinto, onde o sol é escuro por dentro. Onde a luz não alumia o sentir-bem. Lembro-me de um fato recto, preto como os guinchos que a tv recita cá também,
- nisto, os dois mundos, são pares. No pior, no mais pulha das vísceras deles. -
, por dentro do uniforme um homem polido. Polido por asininas etiquetas. Os movimentos são todos esquartejados pela norma. É norma dar os bons-dias mesmo que contrafeitos, mesmo que falsos. É norma agradecer mesmo que não exista a obrigação. É norma não dizer aquilo que se matuta mesmo que seja verdadeiro. Mesmo que sincero. O fato caía em ameaçador negro até à sola do sapato. Sem dobras nem ondas. Recto como a face empedrada dele. Enquanto vergo o cotovelo para levar o pedaço de lagosta amputada à boca
- garfo na mão direita, sempre à bulha com a norma -
, lembro-me das toalhas de papel com altinhos sequenciados, do tapete de plástico aos furos, do copo e do prato separados por toalhetes grosseiros. Esse restinho de elegância e pompa depositada no bom-dia, lá verdadeiro, fazia-me bem. E eu sorria. Sorria porque lá sou feliz. E aqui não. Aqui a norma não me deixa.
Lá fora, sobre os vidros dos carros pretos, abate-se um sol carnudo de burguês.
jtf